Em Nova York, Lula pretende firmar a posição do Brasil como referência do Sul Global
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou à cidade com a missão de reforçar a posição do Brasil como um líder emergente do Sul Global e participará de eventos importantes, como a Cúpula do Futuro e a Assembleia Geral da ONU
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou à cidade com a missão de reforçar a posição do Brasil como um líder emergente do Sul Global e participará de eventos importantes, como a Cúpula do Futuro e a Assembleia Geral da ONU. Lula pretende discutir temas como o multilateralismo, a mudança climática e a luta contra a fome, além de propor reformas significativas nas estruturas internacionais.
A viagem de Lula é essencial para reforçar sua meta de ser um protagonista na reformulação das regras globais e do sistema internacional.
Este será um teste para a política externa do Brasil, que avaliará sua capacidade de influenciar o cenário global em meio à reorganização de poderes e instituições, como a ONU.
Lula participará de cerca de 30 encontros bilaterais, com reuniões já confirmadas com a França, Haiti, Espanha e União Europeia. Após o anúncio do retorno do Brasil ao cenário internacional em 2023, o objetivo agora é mostrar os primeiros resultados dessa retomada, com foco na aliança contra a fome e no papel do país no G20.
O discurso de abertura da Assembleia Geral foi elaborado pelo Itamaraty e ajustado pelo Palácio do Planalto. O texto irá destacar a questão climática, tendo em conta a relevância das queimadas recentes no Brasil.
Espera-se também que o presidente brasileiro dê continuidade aos temas já abordados no discurso emitido durante a Cúpula do Futuro, quando Lula subiu o tom das críticas, lembrando que o sistema multilateral atual, incluindo a ONU e o Conselho de Segurança, precisam de reformas profundas para incluir o Sul Global de forma mais justa e eficiente.
Além disso, Lula deve dobrar a aposta por uma maior regulação dos meios digitais, como plataformas como o X (ex-Twitter), para evitar a propagação de notícias falsas e discurso de ódio e, assim, proteger a democracia.
Compromissos do Presidente e da Comitiva
Além dos compromissos já mencionados, Lula participará de eventos promovidos pela Iniciativa Global Bill Clinton e dividirá o palco com Bill Gates na premiação Goalkeepers, onde receberá um prêmio por sua trajetória no combate à fome.
Trata-se da premiação anual da Fundação Bill e Melinda Gates que reconhece indivíduos que tenham contribuído para a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Estão confirmadas reuniões bilaterais de Lula com o Primeiro Ministro do Haiti, Garry Conille, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Com relação ao governo brasileiro, destaca-se a participação em uma atividade da Cúpula para o Futuro, organizada pela Plataforma Global de Líderes Mulheres nas Finanças. O Brasil terá uma participação destacada nas discussões sobre financiamento para a transição justa e para energia verde.
A ex-presidente Dilma Rousseff, atual presidente do Banco de Desenvolvimento do BRICS (NDB), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, participarão ao lado de líderes como Janet Yellen, secretária do Tesouro dos EUA, e Kristalina Georgieva, diretora-geral do FMI.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, abordará a transformação ecológica e o uso de facilitadores financeiros para ampliar o financiamento público e privado.
O evento também destacará o papel das mulheres nas finanças, com a presença da ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, discutindo como mulheres líderes poderão acelerar o financiamento de energia verde.
Impacto das enchentes no Rio Grande do Sul
Durante um evento do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) ocorrido em Nova York, o brasileiro que preside o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, antecipou que as enchentes no Rio Grande do Sul terão um impacto econômico de R$ 87 bilhões. Segundo um estudo elaborado em conjunto pelo BID, CEPAL e Banco Mundial, a retração do PIB gaúcho deve ser de 1,8% neste ano.
O estudo completo será divulgado nos próximos dias. Goldfajn também compartilhou informações sobre as ações que estão sendo tomadas no estado. Em maio, o BID ofereceu R$ 5,5 bilhões em assistência, além dos R$ 10,5 bilhões destinados a financiar iniciativas relacionadas à crise hídrica no Brasil.
Durante o evento, Goldfajn recordou a gravidade da situação. “Há alguns meses, eu estava no Brasil ajudando e oferecendo assistência com as enchentes no Rio Grande do Sul de abril. Foi a pior enchente já registrada, deixando 182 pessoas mortas e muitas desabrigadas.”
Participação do Brasil na Climate Week NYC
A Climate Week NYC, que começou neste domingo dia 22 e vai até o dia 29 de setembro, é um evento que acontece anualmente em paralelo à Assembleia da ONU. A atividade reunirá representantes dos setores público e privado para impulsionar a ação climática.
No dia 24 de setembro, organizações da sociedade civil brasileira realizam o evento "Climate Politics and Climate Science". O encontro, promovido pelo Instituto Arapyaú, Instituto Clima e Sociedade (iCS) e Uma Concertação pela Amazônia, visa debater desafios e soluções na agenda climática com a participação de autoridades e cientistas.
Entre outros temas, serão discutidos os preparativos para a COP30, que ocorrerá em Belém do Pará em 2025, quando, pela primeira vez, a conferência será realizada na Amazônia. Estarão presentes Ana Toni, secretária nacional de Mudança do Clima e o embaixador brasileiro André Corrêa do Lago.
'Naturalizar a fome de 733 milhões seria vergonhoso', diz Lula, que citou 'fracasso coletivo' em cúpula da ONU em NY
O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, fala à Assembleia Geral das Nações Unidas durante a Cúpula para o Futuro, no domingo, 22 de setembro de 2024, na sede da ONU. (AP Photo/Frank Franklin II) AP - Frank Franklin II
"Naturalizar a fome de 733 milhões de pessoas seria vergonhoso", afirmou ainda o presidente brasileiro, antes de lembrar que a crise de governança mundial exige transformações estruturais. Lula considerou que o mundo caminha para um "fracasso coletivo" e que não atingirá metas de redução de fome e pobreza. O presidente brasileiro elogiou ainda o Pacto Global Digital para "diminuir assimetriais" e exclusões decorrentes de "novas tecnologias como a Inteligência Artificial".
"Falei anteriormente sobre a necessidade de reformar a ONU, para que ela possa cumprir seu papel histórico", disse o chefe de Estado brasileiro, dizendo que a "reflexão conjunta" havia apresentado frutos, como "o Conselho dos Direitos Humanos".
"Voltar atrás em nossos compromissos é colocar em xeque tudo o que construímos tão arduamente", afirmou Lula, que dispunha de apenas cinco minutos para falar, e acabou tendo o microfone cortado na ONU, por ultrapassar o tempo, mas continuou o discurso até o fim.
Pacto pelo futuro
Em um mundo ameaçado por "riscos catastróficos crescentes" como guerras, mudanças climáticas e pobreza, os líderes dos 193 países da ONU adotaram neste domingo (22) um "Pacto para o Futuro" da humanidade, apesar da oposição de alguns países como Rússia, Venezuela e Nicarágua.
"Convoquei esta cúpula porque os desafios do século 21 devem ser resolvidos com soluções do século 21" , afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, após a adoção deste texto com 56 medidas para enfrentar os "maiores desafios do nosso tempo".
Estes desafios vão desde a reforma do Conselho de Segurança da ONU, a arquitetura financeira global, a manutenção da paz e as mudanças climáticas, até questões mais inovadoras, como a inteligência artificial.
Guterres lançou a ideia da chamada 'Cúpula do Futuro' em 2021, mas nos últimos dias não escondeu sua frustração diante das dificuldades de chegar a um consenso para um texto ambicioso, para o qual pediu aos Estados que mostrassem "visão", "coragem " e "ambição".
"Acreditamos que existe um caminho para um futuro melhor para toda a humanidade, incluindo para aqueles que vivem na pobreza e na exclusão", diz o texto, ao qual se opuseram Rússia, Venezuela, Nicarágua, Coreia do Norte e Belarus.
Apesar da oposição dos países liderados pela Rússia, o Pacto e os seus anexos (Pacto Global Digital e Declaração para Gerações Futuras) foram adotados por consenso, mas não são vinculantes.
Esta nova "caixa de ferramentas" define novos compromissos, abre "novos caminhos para novas possibilidades e oportunidades", lembrou Guterres, que prometeu trabalhar "para sua concretização até ao último dia" de seu mandato.
"Não retroceder"
"Abrimos a porta, agora todos nós devemos passar por ela, pois não se trata apenas de nos entender, mas de agir. E hoje os desafios a agir", disse Guterres.
Para a ONG Human Rights Watch, o projeto inclui alguns "compromissos importantes" nesta área, e também acolhe os elementos importantes sobre "direitos humanos".
Mas "os líderes mundiais devem demonstrar que estão dispostos a agir para garantir o respeito pelos direitos humanos", insistiu Louis Charbonneau, especialista da ONG na ONU.
O combate ao aquecimento global foi um dos pontos mais sensíveis da negociação, em particular a "transição" das energias fósseis para as mais limpas.
"Não é revolucionário"
Embora existam algumas "boas ideias", "não é o tipo de documento revolucionário" para reformar o multilateralismo que Guterres gostaria, disse Richard Gowan, pesquisador do International Crisis Group.
Uma opinião compartilhada entre diplomatas dos Estados-membros da ONU: "morno", "o menor denominador comum", "decepcionante" foram os adjetivos mais frequentes para classificar o documento.
Os países em desenvolvimento exigiram compromissos concretos relacionados às instituições financeiras internacionais, para facilitar o acesso preferencial ao financiamento de medidas para enfrentar as mudanças climáticas.
"Este é um sinal positivo para o caminho a seguir, mas o verdadeiro trabalho está na implementação e os líderes políticos devem transformar esta promessa em ação", reagiu o diretor-executivo do Greenpeace Internacional, Mads Christensen.
"Este pacto deve realmente oferecer um futuro que as pessoas desejam: livre de combustíveis fósseis e um clima seguro", concluiu.
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